Duas práticas que me ensinam muito a como encarar a vida são a yoga e o naturismo.
Com a yoga aprendo e pratico a concentração, percepção e serenidade. Com o naturismo exerço diariamente aceitação, respeito e liberdade. De certa forma, essas práticas são tão complementares. É se percebendo e percebendo o outro que se exercita a aceitação irrestrita e vivendo com liberdade acaba se tendo uma vida serena e plena. Por que não unir essas duas lindas práticas e ensinamentos? Foi assim que há alguns anos tropecei em uma notícia sobre alguns lugares no mundo estarem começando a oferecer aulas de yoga feitas da forma mais liberta possível – SEM ROUPAS.
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Imagem: Edson Vieira
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Infelizmente no Brasil a prática de
yoga nu não existe ou existe de uma forma muito escondida e pouco acessível, difícil de encontrar pela internet por exemplo... Vejo nisso muito do velho preconceito e associação da nudez com sexo. Já ouvi de muitos professores de yoga, equivocadamente e talvez por falta de informação correta e excesso de informação errada propagada pela sociedade, que fazer yoga nu vai contra tudo que a prática propõe, que vai virar uma aula sexual, que vai desvirtuar os propósitos. Acho que ficou claro pelo começo do meu relato, como essas duas culturas se fundem. Ao fazer yoga, o praticante se propõe a estar aberto para se conhecer, para se entender, uma busca pela introspecção e é tudo isso que alcançamos quando estamos nus, quando estamos confortáveis com nós mesmos, com nossos corpos, com a nossa diversidade. Quando se faz yoga, busca-se a iluminação, a transcendência, descolar desse mundo material e irreal. Nada mais iluminador do que a sensação de liberdade, de plenitude e de descolamento das regras sociais infundadas que o naturismo nos proporciona.
Felizmente, há algumas semanas, numa viagem para o exterior, surgiu a oportunidade de poder fazer uma aula de yoga nu, em um
estúdio em Nova York. Fiquei animadíssimo e fiz com que essa oportunidade não fosse perdida. Numa tarde de domingo fui ao estúdio, empolgado, curioso e, acima de tudo, disposto a experimentar algo que tinha tudo para ser incrível. O estúdio oferece aulas para homens, para mulheres e para turmas mistas. O horário em que pude participar era o da turma de homens.
Ao chegar, naturalmente todos tiram suas roupas e já dá para sentir a alegria e leveza no ar por poderem se libertar das casquinhas sociais. Cada um toma um lugar na sala e esperamos pelo professor. A aula tem basicamente duas partes: uma “individual” e uma em parceria (parte mais interessante e que inesperadamente me trouxe muitas experiências humanas).
No começo todos se sentam em um círculo para se apresentarem, o professor fala algumas palavras sobre os princípios da yoga, alguns ensinamentos são passados e então a aula prossegue, cada um em seu lugar, fazendo posturas comuns da yoga. Logo de início já me ocorreu algo interessante. Já nessas primeiras posturas, e acredito que de certa forma intencionalmente, acabamos ficando em situações que geralmente seriam extremamente vergonhosas para o contexto social e pudico em que vivemos. Ficar numa postura expondo-se os anus ou os genitais e mesmo assim ninguém ter vergonha de ninguém ou achar isso engraçado é confortavelmente lindo. Aqui as barreiras que colocamos cotidianamente entre nós e nossos próximos começam a cair. E caem por um motivo simples –
não fazem sentido.
Todo mundo é gente, todo mundo vive e respira o mesmo ar, então por que ter vergonha de partes do corpo que todos nós possuímos e que apresentam as mesmas funções em todos os seres? A aula prossegue e em minha mente, creio que na dos outros também, só se passa uma coisa: que delícia estar fazendo isso nu, é tão mais prático fazer yoga sem roupas, sem nada te apertando ou te segurando. E, curiosamente talvez pra quem ainda não pratica naturismo, ninguém parece pensar ou perceber que todas estão nus, é tudo literalmente natural!
Após cerca de 40min, pelas posturas serem dinâmicas e vigorosas, todos vamos ficando muito suados. Com esse suador todo começa a parte da aula em duplas, a qual eu estava aguardando muito, principalmente por não saber exatamente como seria e que reações ou pensamentos me proporcionaria. Essa parte é estruturada para treinarmos a aceitação e romper de vez as barreiras com o próximo. E de cara essas barreiras são realmente extintas. A primeira coisa proposta para se fazer com seu parceiro (alguém que estivesse mais próximo) é enxuga-lo, secar todo esse suor gerado. Que momento lindo! Cheguei a me emocionar nessa hora. É um ato de entrega, de cuidado. Enxugar o seu parceiro, fazer com que ele se sinta bem, e também estar recebendo isso com trocas de sorrisos genuínos é de uma cumplicidade sem igual! Esse mundo impositivo, frio e de plástico em que temos vivido só faz com que nos afastemos dos nossos iguais. Ele faz com que cada vez mais nos isolemos e com isso vem o egoísmo, vêm as sensações de que somos melhores simplesmente por sermos diferentes e que os outros são piores pelo mesmo motivo, a diferença. Se vivêssemos num mundo com mais cumplicidade entre os seres, com mais toque, com mais exibição de carinho, todos esses preconceitos e crimes de ódio não teriam espaço e nem sentido. Ao tocar alguém que eu nunca vi na vida e proporcionar bem estar para esta pessoa, assim como ela proporcionava para mim, é algo transcendente; é parte da iluminação que a yoga propõem e, nesse caso, tudo isso pelo fato de estarmos nus, nus de corpos e também de almas, com sentimentos abertos. Achei intrigante e ao mesmo tempo pleno o fato de sentir afeto naquele momento por alguém que nunca vi na vida e por fazer um ato tão simples que foi tocar essa pessoa... Toda essa complexidade da atualidade faz a gente se esquecer de como as coisas mais simples são as mais profundas e transformadoras!
Assim a aula segue em duplas, com muito contato, com muita comunhão e cumplicidade, numa sala cheia de um sentimento fraternal e de humanidade. No final as duplas se abraçam, depois todos se abraçam juntos e por fim todos vão trocando abraços uns com os outros. O abraço nu é o máximo da liberdade, a sua pele tocando a pele do outro (importante ressaltar aqui: sem nenhuma conotação sexual) dá uma sensação de unidade. Todos somos iguais porque todos somos diversos. Sentir essa unidade proporcionada por toda cumplicidade gerada por estarmos nus numa mesma sala, por estarmos em contato com o próximo nu na prática em dupla e nos abraços, foi algo muito importante. Novamente aqui a yoga e o naturismo se fundem. Os grandes mestres nos ensinam que ao alcançarmos a iluminação nos damos conta de que tudo é uma coisa só, que todos somos conectados, que todos somos um, e ter um pouquinho dessa sensação de unidade proporcionada pela nudez e pelo sentimento de fraternidade com o próximo é algo memorável e que recomendo a todos.